Gasshuku: Conhecendo o kata/bunkai do Goju-Ryu Jundokan

Em novembro de 2019, participei do Gasshuku da escola Jundokan, de Goju-Ryu. O Jundokan é uma escola fundada em Okinawa pelo mestre Eiichi Miyazato, que foi aluno direto do Chojun Miyagi. Ela é era considerada uma das escolas que melhor preserva a forma como o mestre Miyagi ensinava o Karate depois da 2ª Guerra, antes de falecer, sendo então um link muito importante para a gente entender melhor o Karate como era praticado antigamente e as modificações que que foram feitas posteriormente.

O Jundokan também é considerado uma escola bastante reservada e tem poucos representantes pelo mundo. Tanto que o único representante oficial aqui na América Latina é o sensei Pablo Scurzi (6º Dan) da Argentina, que foi o ministrante desse seminário. Sob a tutela de Scurzi estão escolas no Chile, Colômbia e Brasil.

O seminário ocorreu nos dia 16 e 17 na cidade de Linhares, no Espírito Santo. Este evento foi organizado pelo sensei Thulio Gandra, um amigo meu que realiza um trabalho muito bacana no Espírito Santo e é aluno do Scurzi.

No seminário a gente teve oportunidade de estudar as versões de alguns kata do Jundokan e também explorar um pouco das possibilidades de bunkai dessa escola. Entre os kata praticados, estiveram Gekisai Dai Ichi, Saifa e Seyunchin.

Mas eu não estava sozinho nesse evento. Eu fui acompanhado do meu grande amigo Samir Berardo, do Muidokan Karate Kenkyukai, da qual eu também sou membro, além de ser membro da Associação Karate-Do Tanaka.

Inclusive, na programação do evento, além das aulas ministradas pelo sensei Scurzi também houveram treinos particulares que a gente realizou do conteúdo do Muidokan com os alunos do sensei Thulio. Então foi uma oportunidade de complementar: além de a gente estudar o bunkai do Jundokan a gente estudou também um pouco do bunkai e as técnicas do Muidokan, e conseguiu perceber um pouquinho a similaridade entre os dois.

Somando tudo, a gente treinou mais ou menos 18 horas nesse fim de semana. A gente chegou na noite de sexta-feira, treinou de madrugada, na manhã seguinte teve treino com o sensei Scurzi, depois teve pausa, voltamos para o treino com o sensei Scurzi e teve treino à noite com o Samir ministrando o conteúdo do Muidokan. No domingo de manhã teve de novo seminário como sensei Scurzi, concluindo o conteúdo dele, depois teve mais treino do conteúdo do Muidokan para o pessoal do grupo do sensei Thulio.

Então foi uma oportunidade muito intensa e muito bacana de troca e de compartilhamento do Karate. E mais ainda: de Karate de qualidade.

O bunkai do Jundokan tem uma característica muito interessante que eles chamam de Renzoku Bunkai, que é a conexão contínua dos movimentos do começo ao fim do kata. Para cada movimento, o oponente pode ter uma resposta e dentro disso tem uma conexão que leva ao próximo movimento.

Esse tipo de abordagem não é exclusiva do Jundokan, mas essa é uma das organizações que melhor faz esse tipo de bunkai. Outro expoente no trabalho com Renzoku Bunkai é o sensei Masaji Taira, que foi aluno de Miyazato e instrutor do Jundokan.

E esse tipo de bunkai demonstrado pelo sensei Scurzi tem vários elementos em comum com a pesquisa que já é realizada pelo Muidokan, pelo Samir Berardo. Apesar de terem algumas abordagens e estratégias diferentes, a ideia de conexão do kata, de um movimento levar ao outro, está muito presente no bunkai que é realizado pelo Muidokan, que eu, particularmente, considero de alto nível e foi uma das coisas que me levaram a entrar para essa organização.

Esse bunkai do Muidokan, que tem características e abordagens específicas, mas que de certa forma complementam o que foi apresentado pelo sensei Scurzi no Gasshuku, pôde ser conferido por quem participou do seminário que eu organizei com o Samir Berardo em maio de 2019.

Esse bunkai, baseado em conexões e movimentos contínuos, tem um contexto de curta distância, que é próprio para a abordagem original do Karate, que era a defesa

pessoal. Com o tempo, o Karate foi modernizado, foi transformado em esporte, e as competições passaram a dar ênfase para socos e chutes que vinham da média e da longa distância. Mas na defesa pessoal você não tem esse luxo e você trabalha não só com socos e chutes mas também com agarrões, com chaves, com estrangulamentos, com arremessos e com ataques a pontos vitais. E foi isso exatamente que a gente viu nesse bunkai tanto apresentado pelo Jundokan quanto no complemento depois feito pelo Samir, com o conteúdo do Muidokan.

Então vocês veem: esse fim de semana foi de treino de coisas distintas, de escolas distintas, uma originada em Okinawa e um grupo de pesquisa daqui do Brasil, mas que pela sua busca de entender, com senso crítico, o kata e o Karate, chegaram a conclusões que se complementam. E a gente só tem a ganhar com isso.

O que eu mais tiro desse fim de semana de treino do Gasshuku, além obviamente de ter estudado um pouco mais o Karate realizado pelo Jundokan, que já era uma vontade minha, e de ver as similaridades desse Karate com que eu mesmo já vinha estudando e praticando tanto no Muidokan quanto na minha pesquisa particular, foi a integração, a oportunidade de treinar tanto com o sensei Scurzi quanto com os meus amigos sensei Samir e sensei Thulio.

Além disso eu fiz muitos amigos também. A gente treinava fazia os kata e fazia os exercícios em dupla sorrindo, se divertindo, porque a gente estava compartilhando o Karate.

Sempre que eu posso, participo de  treinos fora, de seminários, e sempre aprendo alguma coisa nova, nem que seja uma coisa para incorporar no meu Karate e para agregar para o meu estudo dessa arte marcial. Então a gente ganha quando a gente mantém o nosso espírito aberto para troca, para complementar o nosso conhecimento e até para reavaliar algumas coisas que a gente achava que sabia, mas que novos fatos podem trazer uma perspectiva diferente. E assim a gente sempre cresce.

Então, só tenho a agradecer ao sensei Thulio Gandra por convidar eu e o Samir para participar desse evento, ao sensei Scurzi pela disponibilidade, boa vontade e simpatia de ensinar um pouco do Karate Jundokan para a gente. E para todos companheiros, todos os participantes que estiveram nesse evento e que contribuíram de forma muito positiva e muito cordial para que o evento fosse excelente. Agradeço a todos vocês que participaram e agradeço a você também, por acompanhar meu conteúdo.